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Textos de minha vida.

domingo, fevereiro 13, 2005

A apoteose de Lula - por Tina Evaristo

A vida anda azul para o presidente Lula. Sua popularidade está em 62%; a inflação continua em queda, apontando para 6% em 2005; o crescimento resiste no patamar de 4% – e se tudo correr nos trilhos, este ano o Brasil sobe da 15ª para a 12ª posição no ranking das economias mundiais. Mas a apoteose de Lula no poder ainda está para ocorrer. Na noite da quinta-feira 27, o presidente embarca rumo a Davos, nos Alpes Suíços, em seu novo avião oficial, um Airbus A-319, de US$ 56,5 milhões, batizado de Santos Dumont, mas apelidado de AeroLula. A viagem marcará o début internacional da aeronave. Quando cruzar o Atlântico, ao custo de US$ 2,1 mil por hora, os brasileiros terão gastado R$ 79,4 mil com a travessia. Lula está indo a Davos participar pela segunda vez do Fórum Econômico Mundial. Erguida ao pé da Montanha Mágica imortalizada por Thomas Mann, Davos abriga uma das estações de esqui prediletas das elites européias. O Itamaraty conseguiu instalar o presidente e sua mulher Marisa no hotel mais luxuoso do lugar, o Belvédère, onde as suítes custam entre US$ 555 e US$ 660. Na sexta-feira 28, o presidente terá a oportunidade de ocupar por 30 minutos o púlpito principal, no Centro de Convenções, para ler sua mensagem a um seleto público formado por 25 chefes de Estado, 70 ministros, 76 lideranças da sociedade civil e 500 empresários que confirmaram a presença no evento – gente do calibre de Bill Gates, da Microsoft, e Chuck Prince, do Citigroup. A glória, em alto estilo. Lula será o único estadista sul-americano convidado a discursar no principal auditório. Na semana passada, a assessoria do presidente preparava um discurso sobre o seu projeto do Fome Zero Mundial. “O terrorismo não deve ser combatido com armas, mas com a transferência de riqueza aos mais pobres”, deverá dizer na conferência.

O presidente mandou alugar para ele o melhor salão do Hotel Belvédère, o Atlantis (US$ 27,7 mil a meia diária) para que no sábado 29 apresente a investidores internacionais o projeto das Parcerias Público-Privadas. Um time de assessores do chanceler Celso Amorim (vai a Davos de AeroLula) e do ministro Luiz Fernando Furlan (também conseguiu vaga no AeroLula), está há três semanas convidando executivos de multinacionais para almoçar com o ministro José Dirceu. O Brasil encomendou refeição para 150, ao custo de US$ 55 por cabeça. Até a última quinta-feira, 80 deles tinham acenado com a presença. Bill Gates foi chamado. Executivos da Microsoft avisaram que já estava com a agenda cheia. Dentro da Casa Civil, assessores de Dirceu estão contando a versão de que Gates é que teria pedido para ver Lula – mas que nosso presidente estaria sem tempo de falar com o homem mais rico do mundo.

“Este governo virou um espetáculo do deslumbramento”, critica o senador Jorge Bornhausen, presidente do PFL e inquilino de sete governos anteriores. “Por sua história de vida, o presidente Lula já deveria estar imune a brinquedos caros, como um avião de luxo.” A rigor, ninguém discute a necessidade do presidente precisar de um avião novo. O anterior, o Sucatão, um 707 há quatro décadas no ar, já estava proibido de aterrissar nos principais aeroportos da Europa e dos Estados Unidos. Ademais, a hora de vôo do Sucatão custava US$ 7 mil, três vezes e meia a mais que o custo do AeroLula. “O que se critica não é a compra da aeronave, mas o momento em que foi feita”, explica o economista Raul Veloso, maior especialista do País em finanças públicas. Desde que chegou ao poder, tem sido comum a Lula e a seu círculo íntimo de assessores inverter prioridades. “Esse governo se mobiliza com eficiência para gastar com o supérfluo, mas não despende esforços quando na pauta estão itens realmente necessários”, avalia o cientista político Paulo Kramer, da Universidade de Brasília, referindo-se aos projetos sociais.

Os gastos oficiais com passagens aéreas também surpreendem. De acordo com os números apontados pelo Sistema Integrado de Administração Financeira, o Siafi, o Executivo desembolsou no ano passado cerca de R$ 800 milhões em viagens. Mas utilizou somente R$ 29,4 milhões no programa “Primeiro Emprego”, uma das bandeiras do governo. No caso do Programa Nacional de Combate às Drogas, foram gastos apenas R$ 4,1 milhões – menos de um quarto do valor que Lula se esforçou para levantar junto a empresários para a reforma do Palácio da Alvorada. Nas últimas semanas, por exemplo, o Palácio do Planalto empenhou R$ 500 mil para a compra de livros e divisórias para a Biblioteca Presidencial; mais R$ 375 mil em uniformes novos para segurança e motoristas, R$ 51 mil em louças e R$ 15 mil em flores e R$ 7,3 mil em um novo tablado especial para que os seguranças de Lula possam treinar lutas marciais. “É muito gasto com bobagem”, diz o deputado Augusto Carvalho, autor do levantamento no Siafi. “É notório que o dinheiro público está sendo mal aplicado.” Como o presidente mudou-se em outubro para a Granja do Torto por conta da reforma no Alvorada, foi preciso resolver alguns desconfortos. Foram gastos, por exemplo, R$ 4,6 mil na compra de uma máquina de café expresso, R$ 820 em caixas acústicas para home theatre e outros R$ 666 num CD player para Omega australiano que serve ao presidente. Outros mimos estão a caminho.